Carlos Luiz Souza *
O mês de setembro nos convida a uma profunda reflexão sobre a fragilidade da vida. Se por um lado o Setembro Amarelo ilumina a importância da saúde mental e da prevenção ao suicídio, a Semana Nacional do Trânsito nos coloca face a face com a responsabilidade individual e coletiva que permeia cada trajeto. Mas seria apenas uma coincidência a junção dessas duas campanhas no mesmo mês? A conexão, na verdade, é muito mais profunda e urgente do que imaginamos.
Enquanto buscamos ativamente o bem-estar biopsicossocial, temas como o suicídio e a segurança no trânsito ainda se escondem sob o véu do tabu. A associação do amarelo ao mês de setembro, em homenagem ao jovem Mike Emme que partiu precocemente dentro do seu Mustang amarelo, transcendeu a esfera pessoal e se tornou um símbolo de luta contra o silêncio que aprisiona tantas pessoas em suas dores. A maior parte daqueles que passaram pela perda de pessoas amadas devido a suicídio desenvolvem, por um lado, transtorno do luto complexo persistente, que remete a pensamentos ou sentimentos angustiantes relacionados com o sofrimento pela separação. Além disso, também desenvolvem Transtorno do Estresse Pós-Traumático (TEPT), que se caracteriza por pensamentos intrusivos relacionados, por exemplo, com o fato de ter presenciado ou ter encontrado o corpo da pessoa que se matou.
A necessidade de falar, de pedir ajuda, ecoa como um mantra a ser repetido e amplificado. E é nesse ponto que a Semana Nacional do Trânsito, com o tema “a paz no trânsito começa por você”, se entrelaça com a saúde mental. Afinal, a saúde mental não se limita aos consultórios, mas se manifesta em cada esfera da nossa existência, inclusive no volante.
Dados do CVV revelam que a depressão, o transtorno bipolar e a dependência química são fatores de risco importantes para o suicídio, e essas mesmas condições impactam diretamente na atenção, tempo de reação e tomada de decisões de um motorista. A ansiedade, o estresse, a raiva, tão presentes no caos do trânsito, podem ser gatilhos para comportamentos imprudentes e acidentes fatais.
É preciso reconhecer que a saúde mental não se resume à ausência de doenças, mas sim a um estado de equilíbrio que nos permite lidar com as adversidades e tomar decisões conscientes, tanto na estrada da vida quanto no asfalto.
As campanhas de setembro nos convidam a olhar para além das estatísticas e reconhecer a humanidade por trás de cada número. A vida, frágil e preciosa, exige cuidado, autoconhecimento e empatia. Ao assumirmos a responsabilidade por nossa saúde mental e pelas vidas que cruzam nossos caminhos, construímos um futuro mais seguro e esperançoso, onde cada trajeto seja uma oportunidade de celebrar a dádiva de estarmos vivos.
*Carlos Luiz Souza é Psicológo Especialista em Trânsito e vice-presidente da Associação de Clínicas de Trânsito do Estado de Minas Gerais (ACTRANS-MG).